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O tempo, os desafios e as estratégias da consolidação empresarial são analisados a partir das táticas de empreendedores(as)

Escrito por Ligia Gabrielli

Qual o tempo necessário para que uma empresa recém-aberta deixe de ser vista como uma aposta arriscada e passe a ser reconhecida como um negócio sólido? Essa pergunta, recorrente entre empreendedores(as) e investidores(as), acaba de ganhar uma resposta precisa e embasada. De acordo com uma pesquisa conduzida pelo docente Osvaldo De Sordi, da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios da Universidade Federal de São Paulo (Eppen/Unifesp) - Campus Osasco, o tempo médio para que um empreendimento seja socialmente legitimado – ou seja, reconhecido como confiável por clientes, fornecedores(as) e financiadores(as) – é de 42 meses. 

O estudo, publicado na European Business Review, é resultado de uma ampla investigação que envolveu 62 entrevistas com fundadores(as) de empresas consolidadas e a aplicação de um questionário a 77 gestores(as) de vendas de empresas fornecedoras de recursos (em relações B2B). O objetivo: entender como os negócios atravessam o chamado “período de juventude” – fase em que a falta de histórico e de credibilidade ainda pesa contra o novo empreendimento – e quais ações são fundamentais para sobreviver e prosperar nesse intervalo. 

Esse período inicial crítico é descrito pela literatura como “liability of newness” (ou "ônus da novidade"), conceito proposto por Stinchcombe em 1965. Ele se refere à correlação negativa entre a idade da organização e sua taxa de mortalidade: quanto mais jovem a empresa, maior a chance de fracassar. Dados internacionais e brasileiros confirmam essa vulnerabilidade: mais da metade das empresas fecha antes de completar cinco anos. 

A novidade do estudo de De Sordi está na precisão com que define esse tempo médio de consolidação e, principalmente, na identificação de 15 estratégias utilizadas por empreendedores(as) de sucesso para mitigar os riscos da fase inicial. Dentre essas ações, 12 são de natureza gerencial e 3 se relacionam ao comportamento pessoal dos(as) fundadores(as). E o mais relevante: oito dessas táticas são inéditas na literatura científica e foram descritas pela primeira vez nesta pesquisa. 

A jornada da legitimação 

Segundo o estudo, o reconhecimento social da empresa não depende apenas de métricas financeiras ou da longevidade em si, mas de sinais concretos de que o negócio é confiável, consistente e preparado para o longo prazo. Isso inclui desde a adoção de práticas de governança até a forma como o(a) empreendedor(a) se apresenta aos stakeholders

Entre as táticas gerenciais mais eficazes estão a manutenção de um planejamento estratégico com metas realistas, o desenvolvimento de parcerias com empresas estabelecidas, a busca ativa por certificações e a profissionalização precoce da gestão. Já no campo comportamental, destacam-se atitudes como a disposição do(a) empreendedor(a) para assumir riscos calculados, a persistência frente aos obstáculos e a habilidade de comunicar com clareza os propósitos do negócio. 

“É um processo de conquista da confiança social”, explica De Sordi. “E isso exige muito mais do que apenas sobreviver financeiramente. O(A) empreendedor(a) precisa dar sinais contínuos de que seu negócio tem fundamentos sólidos e está comprometido com a geração de valor”.

 O olhar dos provedores de recursos 

Outro diferencial da pesquisa é a inclusão da perspectiva dos provedores de recursos – empresas que fornecem crédito, insumos ou serviços essenciais para o funcionamento de outros negócios. Para esses atores, o risco de fornecer para uma empresa jovem é maior, o que tende a encarecer ou até inviabilizar relações comerciais. 

Segundo os dados colhidos, esses fornecedores consideram uma empresa “estabelecida” apenas após cerca de três anos e meio de atividade regular, com histórico positivo e indicadores de estabilidade. Antes disso, é comum que limitem o crédito ou ofereçam condições mais restritivas. 

“Esses provedores têm um papel fundamental na sustentabilidade dos negócios, e é por isso que entender seu olhar sobre o processo de legitimação é tão importante”, afirma De Sordi. 

Novos caminhos para a ciência da gestão 

O trabalho de De Sordi e equipe também representa uma contribuição para a ciência da administração. Até então, a literatura tratava o período de consolidação empresarial de forma vaga, com intervalos que variam entre 1 e 10 anos, sem consenso ou respaldo empírico robusto. A pesquisa brasileira preenche essa lacuna ao propor um marco temporal claro e ao detalhar ações que podem ser reproduzidas por outros(as) empreendedores(as). 

O estudo sugere, por exemplo, uma nova classificação que destaca a realidade dos(as) autônomos(as) (ou nano empresários), que operam sem funcionários(as); das microempresas, com equipes de 1 a 9 colaboradores(as); e das pequenas empresas, que contam com 10 a 50 funcionários(as). “Essa segmentação visa ampliar a compreensão sobre as necessidades específicas desses negócios, que, embora representem uma parcela significativa da economia, costumam ser negligenciados pela academia, que concentra grande parte de suas pesquisas e debates nas grandes corporações”, complementa o pesquisador.

Outro ponto relevante é o uso de triangulação metodológica: além de cruzar diferentes perfis de entrevistados(as) (empreendedores e fornecedores), os autores combinaram métodos quantitativos e qualitativos, como análise de conteúdo, testes estatísticos e análise de correspondência. Isso conferiu maior rigor e confiabilidade aos achados.

 Implicações práticas e políticas

Os resultados têm implicações diretas para programas de apoio ao empreendedorismo, políticas públicas e iniciativas de fomento à inovação. Se é possível mapear com mais clareza as principais dificuldades enfrentadas por negócios emergentes e as táticas eficazes para superá-las, torna-se também viável desenhar programas de capacitação mais direcionados e eficientes.

Além disso, a definição de um “tempo de maturação” padrão – 42 meses – pode auxiliar bancos, agências de fomento e investidores(as) na avaliação de riscos e na formulação de políticas de crédito mais justas.

Ainda que o estudo tenha sido conduzido no Brasil, os autores acreditam que seus achados podem ser aplicáveis em outros contextos, com as devidas adaptações. Eles sugerem, inclusive, que pesquisas semelhantes sejam realizadas em diferentes países, para verificar possíveis variações culturais ou setoriais.

Para os(as) empreendedores(as), a principal mensagem é clara: persistência, planejamento e atitudes estratégicas são tão importantes quanto a ideia inicial de negócio. A juventude de uma empresa não precisa ser um obstáculo intransponível – desde que enfrentada com preparo, disciplina e inteligência.

 

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